Animais

A médica e a bióloga que salvam mais de 100 animais exóticos por ano no País

Sónia vive em Coimbra e Marta no Porto. Mesmo à distância, as duas amigas fazem tudo acontecer através da própria associação.
Um trabalho em equipa.

O ano era 2021 quando Marta e Sónia se depararam com um anúncio insólito no OLX: um coelho com “muito mau aspeto” que estava disponível para ser trocado por um telemóvel usado. O responsável pela publicação era um rapaz de 15 anos e as duas amigas — uma bióloga e uma médica — conseguiram convencê-lo a doar o pequeno quadrúpede, que entrou para a história da dupla como o primeiro resgate que fizeram em conjunto. 

“Ele veio num estado miserável, cheio de carraças e magro. Infelizmente, apesar de todos os esforços, acabou por não resistir”, recorda à PiT Marta Mendes, uma bióloga de Vila Nova de Gaia e atual investigadora especializada em comportamento animal com foco nos primatas no Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos. 

Marta e a médica Sónia Rodrigues, de Coimbra, são as duas mentes por trás da Associação Portuguesa de Resgate de Animais Exóticos (APRAE), criada em 2023. Mas antes das duas amigas constituírem a associação que hoje salva mais de 100 animais exóticos anualmente, já trabalhavam em conjunto noutro projeto em que Sónia era voluntária e Marta colaborava como família de acolhimento temporário (FAT).

Na altura, a bióloga começou a estudar e investigar mais sobre o abandono e resgate de animais exóticos e deparou-se com o tal projeto de que Sónia fazia parte. Nos primeiros meses, acolhia apenas um ou dois animais, mas à medida que os resgates se intensificaram e o antigo grupo chegou ao fim, as duas amigas entraram em ação.

“O que era para ser uma coisa temporária acabou por ficar definitiva”, recorda Marta. “Entres os milhares de resgates que já fizemos acabou por surgir uma amizade muito boa”, aponta. E ambas têm histórias semelhantes quando o assunto é o amor pelos exóticos — a bióloga apaixonou-se por Phoebe, uma coelha abandonada, e a médica, por Nimbus, a sua primeira chinchila.

Marta estava a trabalhar no Parque Biológico de Gaia quando encontrou uma coelha com uma pata traseira “completamente torta” e que seria eutanasiada, visto que nenhum centro de recuperação para silvestres pode ficar ou recuperar um animal doméstico, segundo explica a bióloga. De imediato, decidiu acolhê-la. “Acabou por ter de ser amputada mas está desde 2019 connosco. É uma coelha feliz muito rezingona, é a alfa do grupo”, garante.

Já Sónia, teve o primeiro contacto com um animal exótico há sete anos, quando junto do marido decidiu ter uma espécie doméstica que não fosse nem um cão, nem um gato.

“Fizemos imensa pesquisa e acabámos com a nossa menina chinchila Nimbus”, recorda. “Percebemos que era bastante difícil obter informação sobre os cuidados necessários sobre esta espécie e que existia imensa desinformação online, em lojas de animais e mesmo nos veterinários clássicos, bem como imensos animais maltratados e negligenciados, o que nos fez tomar a decisão de começar a criar guias de cuidados bastante práticos, e educar a população nos cuidados a ter com os exóticos”.

Sónia e Marta, respetivamente.

A desinformação continua a ser um problema 

Pouco tempo depois da chegada de Nimbus, a médica juntou-se ao primeiro projeto onde resgatava “centenas de animais” com a ajuda de outros voluntários. A paixão inicial foram as chinchilas, mas enquanto mergulhava neste universo, começou a perceber que os coelhos e os porquinhos da Índia eram os exóticos mais comuns nas casas dos portugueses e, consequentemente, os que precisavam de um acompanhamento mais constante.  

O primeiro resgate que fez foi um conjunto de porquinhos da Índia provenientes de uma criação negligente num galinheiro. “Uma pessoa decidiu ter um casal da espécie para espantar ratazanas  — o que é absolutamente um mito, pois estavam lá ratazanas também — e acabou com 33 porquinhos cheios de sarna, alguns com infeções digestivas provenientes das galinhas e muitas grávidas.”

Sónia acabou por acolher dez machos e os outros voluntários, que atualmente continuam a ajudar a médica através da APRAE como FAT, participaram do resgate e reabilitação. 

Quanto Marta se juntou à luta e criaram a APRAE, a associação veio precisamente para continuar a prestar apoio aos exóticos deixados para trás. O principal problema que continuam a enfrentar é a falta de informação e o fácil acesso que as famílias sem experiência têm aos animais. 

“É possível comprar um coelho no OLX por 5€ ou numa loja de animais na hora. Têm um aspeto muito ‘fofinho’ e são tidos como animais que requerem menos cuidados que cães e gatos — o que é o oposto da realidade — e que por vezes até são oferecidos como presente a crianças”, lamentam. “Quando as se fartam, acabam por ser abandonados ou deixados numa gaiola onde nem se conseguem mexer, sem condições de higiene ou alimentação nenhumas.” 

Através da associação, querem divulgar toda a informação que conseguirem sobre os cuidados necessários para cada espécie e diminuir esta “procura por impulso”. Têm também como foco a “diminuição da criação ilegal, melhorar a legislação na criação legal e fomentar a adoção vs. compra”. 

“Queremos não só resgatar casos de abandono, mas também sensibilizar grandes cadeias e mesmo a política para os cuidados mínimos de bem estar”, frisam. “Por causa disso, colaboramos com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) de forma a sermos consultoras e tentar melhorar aos bocadinhos o estatuto destes fofinhos. Os exóticos são cada vez mais populares mas mesmo assim ainda existe muitos mitos sobre os cuidados a ter com eles.”

 
 
 
 
 
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Precisam de famílias de acolhimento temporário

Além dos coelhos, dos porquinhos da Índia e das chinchilas, a médica e a bióloga acolhem alguns hamsters e ratazanas. E o que mais precisam em termos de apoio na APRAE são famílias de acolhimento temporário que lhes possam dar um lar até encontrarem uma família definitiva . “Fornecemos todo o material e alimentação e pagamos as despesas veterinárias”, garantem. 

As duas amigas também precisam de pessoas que possam ajudar com boleias. Atualmente, têm FAT em três regiões — Porto, Coimbra e Lisboa — e precisam sempre de apoio para fazerem os animais chegarem até os respetivos lares temporários e possíveis famílias. “Temos adoções também pelo País fora e necessitamos de boleias de animais neste contexto”, acrescentam. 

A APRAE também aceita donativos monetários para as despesas veterinárias e bens materiais como feno e ração que podem ser comprados diretamente das lojas parceiras da associação.

“Pela natureza de não termos instalações, preferimos donativos pelas lojas online para que possamos direcionar encomendas à FAT que necessita no momento”, apontam. Os donativos podem ser deixados ou comprados nas seguintes lojas: Exonimalia, Coelhinhos de Gaya, Petter ou Exoticário.

Para acompanhar o trabalho da APRAE, pode seguir a associação no Instagram. De seguida, carregue na galeria para saber mais sobre o trabalho de Marta e Sónia. 

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