Animais

Catarina é advogada de uma associação de resgate. “Há muito trabalho para ser feito”

Já representou vários casos de maus-tratos e negligência animal no País. A maioria "demora bastante" para ter um desfecho.
A luta é constante.

Catarina Carvalho Gomes não recorda, ao certo, qual foi o primeiro caso relacionado com animais que representou, mas a advogada sabe perfeitamente qual foi o mais marcante. Em abril de 2024, um casal de Viana de Castelo foi filmado a agredir brutalmente os cães que tinha em casa por vizinhos, que encaminharam os vídeos para associação ComRaça — Equipa de Resgate Animal. Nessa altura, os voluntários não pensaram duas vezes até se deslocarem ao local.

A saga, porém, durou várias semanas, dado que nem todos os cães foram salvos no mesmo dia. Ana Pinto da Costa, presidente da associação que opera em Matosinhos, no Porto, foi a responsável, em conjunto com Catarina, a dar entrada numa queixa-crime contra o casal acusado de maus-tratos a animais.

“Os casos mais marcantes costumam ser todos, mas infelizmente o mais chocante foi uma situação de uns animais que estavam em Viana do Castelo”, recorda à PiT a advogada de 32 anos. “Lembro-me que para dar seguimento ao processo e apresentar a devida queixa-crime tive que ver vídeos e imagens que me chocaram profundamente, porque eram extremamente fortes e sensíveis, ao ponto de eu ver, infelizmente, uma cadela a ser atirada contra a parede.” Até à data e quase um ano depois, o processo que foi também acompanhado pela PiT não teve um desfecho e continua a decorrer no Tribunal de Viana de Castelo.

Este caso, porém, não é o único que continua sem conclusão. Os desfechos dos processos relacionados com os animais são “bastante demorados”, segundo frisa. “Para o processo começar a andar um bocadinho é só quando chega efetivamente aos meios de comunicação e percebem que isto está a impactar a sociedade”, lamenta.

Ainda assim, aqueles que vão até ao fim não têm penas severas. “Por norma, estamos a falar de pessoas, a maioria delas, que vivem em meios mais recatados e resguardados, como pequenas aldeias. Trata-se de pessoas que são primárias, ou seja, não têm um registo criminal”, explica. “Mas não é só por isso. Acho que pelo facto de se tratar de um crime contra um animal, a maioria dos acusados ​​’safam-se’ com uma pena de multa ou uma pena suspensa.”

A advogada acredita que “a sociedade vive de exemplos” a aplicação de penas consideradas mais leves nem sempre é suficiente para evitar que o crime volte a acontecer. “Isso para efeitos de sociedade e de exemplo a dar não é suficiente para que as pessoas interiorizem que efetivamente estamos a falar de animais e não de objetos, que podemos fazer o que bem entendermos com eles”, sublinha. “Acho que é uma das grandes alterações que necessita de ser reformulada.”

Catarina tem o próprio escritório em Matosinhos.

“Desde cedo deparei-me com a realidade dos animais abandonados”

Desde cedo que Catarina teve o gosto pela “defesa dos mais fracos e desfavorecidos”. Quando miúda, recorda-se que costumava brincar na rua e diariamente via animais abandonados. “Não sabíamos muito bem de onde é que eles surgiam, mas cuidávamos deles como se fossem nossos, brincávamos com eles, trazíamos comida, água e até lhes dávamos nomes”.

Muitos dos patudos ficavam pela região para continuar a receber os mimos de miúdos como Catarina. Ao longo dos tempos, estas memórias continuaram bastante presentes na vida da jovem. “Estas experiências e vivências acabaram por ter impacto na minha vida porque desde cedo me deparei com a realidade dos animais abandonados e sempre quis aqui fazer algo para ajudar a mudar esta situação.”

Quando terminou o ensino secundário e teve de tomar uma decisão sobre o seu futuro, esteve indecisa entre História e Direito, mas acabou por optar pelo segundo e formou-se no Porto, na Universidade Lusíada. Depois de vários estágios, passou no exame da Ordem dos Advogados em 2021 e desde então, tem trabalhado por conta própria no seu escritório em Matosinhos.

Em março de 2023, foi contactada por Ana Pinto da Costa, da ComRaça, para tornar-se na advogada da associação. Desde então, o grupo de resgate tornou-se num dos clientes da profissional, que trabalha com “valores simpáticos considerando a causa animal e a falta de meios de económicos da associação.”

Todos os assuntos que dizem respeito aos animais e à associação no geral passam pelas mãos de Catarina. Neste primeiro ano a ter um contacto direto com a causa animal, a advogada tem vindo a notar cada vez mais a falta de apoios neste meio.

“Muitas vezes, e até falo do meu exemplo com a ComRaça, quando os voluntários fazem pedidos de ajuda às autoridades competentes, estas não têm os recursos necessários para fiscalizar ou não dão a devida prioridade por se tratarem de animais e não pessoas, infelizmente”, aponta. “Isso também impacta um bocadinho a demora dos processos.”

Por outro lado, acredita que o País tem tido alguns avanços no que diz respeito aos animais, nomeadamente “a criminalização dos maus-tratos e do abandono, o reconhecimento dos animais como seres sensíveis, a proibição de debate dos animais nos canis municipais e maior proteção em situações de violência doméstica”.

Contudo, os desafios continuam. “Há a necessidade de alterar a legislação para a aplicação de penas mais severas para os maus-tratos a animais. Temos alguns progressos ao longo dos anos, mas ainda há muito trabalho a fazer”, sublinha. “É preciso mais, e é preciso reforçar a fiscalização e garantir que os crimes de maus-tratos e abandonos têm efetivamente consequências. Era também urgente investir mais em campanhas de sensibilização, promover a esterilização como uma política pública, e também criar medidas que incentivem a adoção responsável.”

Para entrar em contacto com a advogada Catarina Carvalho Gomes, pode fazê-lo através do contacto 913 299 116, do Instagram ou Facebook

De seguida, carregue na galeria para ver algumas fotografias dos animais resgatados do chocante caso de Viana de Castelo, que aconteceu há cerca de um ano.

ver galeria

ÚLTIMOS ARTIGOS DA PiT