Animais

Clara tem 58 anos e cuida de 110 animais sozinha. “Não é fácil, mas faço por amor”

Com poucas ajudas, a presidente faz o que pode pelos gatos que acolhe. Há dias em que fica até de madrugada a limpar o abrigo.
Tem um grupo de gatos pretos em casa.

Para Clara de Sousa, é impossível falar sobre a vida que leva e não se emocionar. Sozinha, apenas com a ajuda do marido e dos poucos apoios que recebe uma vez ou outra, cuida de cerca de 110 gatos no abrigo que construiu no Distrito de Braga. “É por amor porque se não fosse isso, acho que iria empenhar a minha vida”, confessa à PiT.

O pai da amante de animais teve sempre cães e gatos e desde que Clara se lembra, esteve rodeada pelos patudos. Há cerca de duas décadas, começou a dedicar-se ao mundo animal e há cinco anos, construiu o Abrigo da Luna, uma associação onde hoje acolhe centenas de gatos. Todos os dias, a presidente visita os animais pela manhã e é por volta das 21 horas, depois de ter acabado as tarefas diárias, que limpa o espaço.

“Às vezes, são duas ou três da manhã e ainda estou lá a limpar”, partilha. “Gosto de tudo limpinho e para quem tem animal, tem de ser assim”, diz, acrescentando que muitas vezes há os “gatos macacos” que acabam por fazer xixi onde não devem e a cuidadora demora um pouco mais do que o habitual. Mas é com muito gosto que trata de todos os animais, mesmo com os problemas na coluna.

O abrigo foi batizado em homenagem à cadela Luna que chegou a família há 11 anos e assim como a tutora, é apaixonada pelos felinos. Além dos animais que cuida na associação, na propriedade onde vive também trata de um grupo de 12 gatos pretos. “Uns foram encontrados, outros eu quis ficar. A maior parte deles são bebés que vieram e ninguém quis. Fiquei com muita pena e não os meti no abrigo”, sublinha a presidente do abrigo de 58 anos.

Clara frisa que todos os animais a seu cargo estão vacinados, desparasitados, esterilizados e têm microchip. Na associação, conta-nos ainda que tem espaços reservados para animais FIV e FeLV positivos — a SIDA e o corona vírus felinos, respetivamente. Já os patudos saudáveis, têm um “trabalho” importante: todos doam sangue.

“Há alguns que deixaram de dar porque fizeram dez anos, mas deram durante nove”, refere a presidente que já colabora com o Banco de Sangue Animal há quase uma década. “É uma mais valia e ajuda-me um bocado nesta luta porque com a maior parte dos gatos, não tenho de pagar as vacinas e os testes de FIV e FeLV”.

Alguns dos felinos no abrigo.

“Prefiro que vá todo o meu salário e o do meu marido, mas que nada lhes falte”

É este o pensamento que Clara de Sousa tem diariamente. “Nunca fui muito de apelos no Facebook porque acho que é a minha responsabilidade não lhes faltar comida e cuidados veterinários”, partilha à PiT. “Se tiver um animal doente, com PIF ou qualquer coisa, tenho de estar resguardada nesse sentido porque não posso estar à espera que venha alguma coisa para tratar o animal”.

Contudo, confessa que não é fácil. “Muitas das vezes nunca quis partilhar que não tenho dinheiro ou que amanhã [os gatos] não têm o que comer. Prefiro que vá todo o meu salário e o do meu marido, mas que nada lhes falte”, afirma. “O meu marido gosta muito dos animais e é uma pessoa espetacular. Às vezes, diz ‘Estás a gastar todo o dinheiro com os gatos, já não temos nada’ e eu respondo ‘Temos a nossa casa e saúde’ e ele fala pronto, se estou feliz é o que importa”.

Por outro lado, recentemente resolveu criar uma angariação de fundos para ajudar nas obras da associação e em outros aspetos que precisa, como as sinaléticas. Porém, até o momento só conseguiu 15€.

“É como o meu amigo disse, as pessoas estão habituadas que eu consiga tudo sozinha”, lamenta. “Mas existe sempre o sentimento de coração apertado de que não vou conseguir o que preciso ou que alguém faça algo por mau. Durmo sempre ansiosa porque adoro os animais e se me os tirassem, acho que morria um pedacinho de mim”.

Um dos principais problemas enfrentados pela cuidadora é que o abrigo está localizado “a cerca de oito quilómetros da cidade” e a distância, muitas vezes, acaba por afugentar os voluntários que não conseguem lá chegar. Contudo, todas as ajudas são bem vindas e nas redes sociais, o Abrigo da Luna disponibiliza os números de MBWay e IBAN e também partilhar casos de animais mais sensíveis.

Além do trabalho com a associação, que conta com apenas oito sócios atualmente, Clara ajuda animais de rua e famílias carenciadas. “É mesmo por amor porque não posso ir de férias nem fazer nada. Mas pronto, foi a vida que eu escolhi e estou satisfeita, nunca me queixei. Já fui buscar animais no canil de Porto, Braga, em situações de maus tratos e acolho quase sempre bebés. É como o meu marido me diz: ‘O resto vem depois, mulher'”, brinca.

Carregue na galeria para ver alguns dos centenas animais que o Abrigo da Luna acolhe.

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