O grupo Intervenção e Resgate Animal (IRA), que na semana passada anunciou uma manifestação nacional em defesa dos animais, marcado para 21 de janeiro em Lisboa, deu esta terça-feira conta das novidades: já há vários autocarros cheios e haverá tambores e motards na marcha.
“Contactámos o comando dos Bombeiros Voluntários de Camarate, para solicitar a presença da sua banda na nossa manifestação. Queremos marchar em direção ao Tribunal Constitucional ao som dos tambores de guerra”, diz a organização numa publicação na sua página do Facebook.
Este protesto, acrescenta o IRA, “contará com o apoio de duas ambulâncias de socorro, requisitadas/alugadas por nós, para apoio aos irados e iradas durante todo o protesto”. E mais: “Também pedimos que grupos motards se juntassem a nós para o barulho, até agora com a confirmação da presença dos 2RS”.
De Norte a Sul, todos convocados para a manifestação
Relativamente aos transportes, a organização de deteção, planeamento, resgate, reabilitação, adoção e intervenção em cenários de emergência diz que já tem a confirmação de dois autocarros completos com partida do Porto e um outro com partida de Coimbra.
“Partidas de Faro, Évora ou Beja, desconhecemos se alguma associação ou particular está a organizar as partidas. Caso haja algum grupo no Facebook a tratar das partidas de Sul, informem-nos para divulgarmos na nossa página e evento, para que todos os que queiram possam aderir”, apelam.
Quem quiser organizar partidas de outros destinos, refere o IRA, “o mínimo de passageiros é 45 e deverão solicitar orçamentos às empresas de turismo, para que depois nos possam reencaminhar os respetivos”.
“O IRA estará a financiar esses transportes, pedindo apenas aos irados e iradas que reservem os seus lugares pagando um valor simbólico de 3€ por pessoa, de forma a minimizar os aumentos dos valores devido aos combustíveis estarem mais caros”, sublinha.
A organização já tinha anunciado a 19 de novembro que estava a preparar uma manifestação devido ao facto de a lei que criminaliza os maus-tratos a animais desde 2014 estar em vias de se tornar inconstitucional.
No dia 29 de dezembro, quando se soube do arquivamento do processo-crime relativamente ao caso conhecido como “o incêndio da Agrela”, o IRA reagiu de imediato e agendou o protesto.
Para esta manifestação – que arranca da Praça Marquês do Pombal, em Lisboa, às 15 horas – o IRA deixou uma promessa: “Desta vez vamos com tudo. Acabou o Carnaval! Partilhem, marquem já nas vossas agendas, troquem folgas ou férias!”.
O triste caso da Agrela
Corria o mês de julho de 2020 e as temperaturas subiam em todo o País. Os incêndios multiplicavam-se e os bombeiros acorriam a combater as chamas onde conseguiam. Um grande incêndio no distrito do Porto chamava as atenções naquele dia 17. Depois de deflagrar em Sobrado, no concelho de Valongo, alastrou-se velozmente e depressa chegou aos concelhos de Santo Tirso e Paços de Ferreira.
Vários protetores da causa animal, e membros de associações, sabendo da existência de dois abrigos ilegais na serra da Agrela, em Santo Tirso, comunicaram com as proprietárias dos espaços perguntando se precisavam de ajuda. Negaram. Os dois abrigos, quase colados, já tinham sido alvo de denúncia algumas vezes, pela situação degradante em que os animais se encontravam, e os protetores continuaram preocupados. E com razão. No dia 18, o fogo – que acabou por ficar conhecido como o incêndio da Agrela – matou dezenas de animais que não tiveram qualquer hipótese de fugir.
Foi um dia longo. Quando começou a correr nas redes sociais que os dois abrigos – Cantinho das Quatro Patas e Abrigo de Paredes – estavam cercados pelas chamas, muitos cuidadores particulares, populares e membros de associações de animais acorreram ao local. Mas a GNR não deixava ninguém passar, alegando ser propriedade privada. Os ânimos exaltavam-se, as imagens que corriam eram aterradoras. Começaram a chegar cada vez mais pessoas, às dezenas, na tentativa de salvar os animais. Quando conseguiram entrar, furando caminho para os resgatar, já era demasiado tarde para dezenas deles.
Pelas contas, o incêndio da Agrela tirou a vida a 73 animais – 69 cães e quatro gatos. Mas essas foram as mortes naquele dia, porque alguns dos mais de 190 animais resgatados por protetores e encaminhados para várias associações também acabaram por não resistir. Outros já recuperaram fisicamente, mas guardam mazelas psicológicas profundas, como é o caso de Simão.
O que se encontrou no abrigo era indescritível. Havia até arcas frigoríficas com animais mortos. As vozes acusatórias não tinham dúvidas: as duas proprietárias do abrigo poderiam ter permitido a entrada, na noite anterior, e nenhum animal teria morrido. Também a atuação da GNR foi alvo de duras críticas por não ter permitido, durante horas, a passagem de quem queria ajudar.
Foi instaurado um processo-crime, que reuniu várias queixas-crime, contra o presidente da Câmara de Santo Tirso, Alberto Costa, elementos da GNR local, Proteção Civil de Santo Tirso e ex-veterinário municipal (que foi suspenso na sequência da tragédia e depois afastado dessas funções).
A Procuradoria-Geral da República anunciou a abertura de um inquérito do Ministério Público ao caso. Pelo meio, várias manifestações ao longo dos últimos dois anos e meio a pedir “justiça pelos animais da Agrela”, num processo que se tornou bastante mediático. Em dezembro 2020, um inquérito do Ministério da Administração Interna concluiu que não tinha havido infrações dos militares da GNR e dos agentes da Proteção Civil que atuaram no terreno.
No final de 2017 já os dois abrigos tinham sido alvo de denúncia por parte de populares devido à “ situação de insalubridade, ameaça à saúde pública e, mais grave ainda, de maus tratos e negligência a animais indefesos”, recordou na altura o “Jornal de Notícias”. “O caso seguiu para Tribunal e, em 2018, o Ministério Público arquivou o processo, considerando – no despacho divulgado – ‘não haver crueldade em manter animais num espaço sujo, com lixo, dejetos e mau cheiro’”.
Agora, com a decisão, anunciada a 29 de dezembro, de que o Ministério Público arquivou a queixa-crime que partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) apresentou, os ânimos voltaram a exaltar-se na causa animal.
E é por estes e por todos os outros que não têm voz que o IRA convocou a grande manifestação nacional de 21 de janeiro. Percorra a galeria para ver imagens do IRA em ação e de algumas das suas valências.