Quando um agente de execução tem hora marcada para se dirigir a uma morada, quem lá vive já sabe o que esperar. É preciso sair. Os motivos para este tipo de ação são vários, como uma ocupação ilegal ou o não pagamento de rendas. O certo é que termina sempre com as pessoas – e os seus animais, quando os há – na rua. Mas não foi esse o caso para uma família de Coimbra, já que o agente responsável por cumprir a ordem de despejo não conseguiu ficar indiferente à situação em que iam ficar.
Tudo aconteceu a 27 de outubro, na localidade de Cioga do Monte, no concelho de Coimbra. A operação seria rápida, como é habitual nestes casos. Mas o agente de execução, António Matos, não conseguiu virar as costas ao desespero desta família – um casal e as duas filhas, mais o namorado de uma delas –, com quem viviam nove gatos, e não descansou enquanto não encontrou uma solução. E, com isso, o que deveria ser uma ação rápida acabou por demorar cerca de sete horas – por uma boa causa.
António Matos fez tudo o que estava ao seu alcance. Contactou a Segurança Social para evitar que as cinco pessoas ficassem na rua, tendo conseguido que o serviço de emergência social arranjasse uma pensão para a família ficar três noites até ser encaminhada para outra alternativa. Mas também não se esqueceu dos animais: telefonou à Condeixa Pa’tudos a explicar o que se passava e a associação recebeu de braços abertos os nove gatos.
“Trata-se do segundo despejo desta família. Da primeira vez também ficámos com os animais, mas desta vez não nos contactaram. Se não fosse o agente de execução ser meu conhecido e ter-me contactado, não sei. O agente de execução é que arranjou basicamente tudo”, conta à PiT a presidente da Condeixa Pa’tudos, Olga Ruth.
A situação em que os miaus estavam não era, de todo, a melhor. A casa tinha excesso de humidade e ácaros. “Havia gatos que estavam escondidos, dentro de casa, e tiveram de ser capturados. Alguns são muito tímidos”, diz Olga Ruth à PiT. E nos primeiros dias a adaptação foi difícil. “Escondiam-se cheios de medo e não comiam”.
Além disso, alguns têm problemas de saúde. “Temos um gato positivo a FIV e FeLV e outro positivo a FIV”, explica a presidente da associação. São, por isso, animais que precisam de cuidados especiais. “Mas, na generalidade estão todos agora a ambientar-se”, sublinha.
Este foi o segundo despejo
Quanto à família, Olga Ruth sente-se desgostosa com o facto de não terem condições para eles próprios e ainda terem colocado nove gatos dentro de casa. “Estão a repetir comportamentos”. “Este tipo de patologia, de pessoas que vivem na rua e depois ocupam casas – não era o caso desta vez, mas da outra vez foi –, e que enchem as casas de animais… Depois as associações é que andam a recolhê-los”, aponta, com tristeza. “Os animais ficam para trás. São condenados ao abandono e à negligência. É tanta desgraça, tanto pedido de ajuda, tanta miséria…”, lamenta.
A Condeixa Pa’tudos está lotada, mas conseguiu encontrar uma solução. “Estamos cheios, mas arranjámos uma situação provisória, uma sala grande para eles. Se a família, em três meses, recuperar a normalidade, vamos entregar quatro gatos – a lei diz que só podem ser quatro gatos e a família está de acordo. Portanto, cinco deles vão depois para adoção”, explicou Olga Ruth à CMTV.
À SIC, o agente de execução explicou que foi cumprir a sentença do tribunal – por não pagamento de rendas –, mas que não conseguiu deixar-se ficar e permitir que as pessoas fossem para a rua e os animais fossem abandonados. “Estamos a falar de 14 vidas. Fiz o que estava ao meu alcance para me deitar de consciência tranquila”, disse António Matos.
Para este homem, a regra na sua vida – que considera que devia ser a de toda a sociedade – é “não causar mais problemas do que aqueles que existem”. “Temos de nos preocupar com o outro”.
Percorra a galeria para ver algumas fotos do dia da ação de despejo e dos gatos que foram acolhidos pela Condeixa Pa’tudos. que estão agora em segurança e que ficarão mais tarde para adoção – pelo menos alguns deles. A associação conta com a ajuda de todos para os desparasitar, chipar e vacinar.