Foi a cor de Bobi que o salvou. Quando ele e os três irmãos nasceram, o cão escapou à morte camuflando-se na lenha. Hoje, tem 30 anos e todo o mundo o conhece como o cão mais velho de sempre. Ganhou a atenção de todos quando bateu dois recordes do Guinness World Records. Mas para Leonel Costa não foi preciso muito para o conquistar. Bastou abrir os olhos.
Leonel tinha apenas oito anos quando levou Bobi para casa. Ele e a sua irmã, com 14 anos na altura, sempre estiveram habituados aos cães do seu pai caçador. Mas foi a cadela Gira a responsável por transformar a vida de ambos durante várias décadas.
“Teve uma ninhada de quatro cachorrinhos. Na altura, era muito comum as famílias livrarem-se dos cães bebés, antes de eles abrirem os olhos. Eu e a minha mãe já fomos criticados por isso, mas os tempos eram outros”, começa por explicar Leonel à PiT.
A mãe de Leonel aproveitou o momento em que a mãe dos cães foi dar uma volta, para pegar nos três bebés, com o intuito de os enterrar mais tarde. “Mas a Gira continuava a ir lá. Eu e a minha irmã achámos estranho e seguimo-la. Foi quando encontrámos o pequeno cachorrinho castanho”.
Leonel e a irmã tinham duas opções: ou contavam aos pais e concediam ao cão o mesmo destino que os outros, ou guardavam segredo. “Nenhum miúdo resiste a um cãozinho bebé. Então, esperámos uns dias até ele abrir os olhos, pois aí sabíamos que já não o iam matar”, confessa.
Valeu o raspanete e o castigo que levaram quando a mãe descobriu. Bobi vinha a ser muito mais do que um cão para a família “Ele era o meu irmão. Era tudo para mim. À medida que fui crescendo, ele nunca saiu do meu lado”.
Bobi era o companheiro de Leonel para tudo. Nos primeiros anos de vida, era quem o acompanhava até à escola, situada a cerca de um quilómetro de casa, em Conqueiros, no distrito de Leiria. Hoje, a rotina não é muito diferente. Só muda o destino. “Todos os dias levo-o de manhã e à tarde a passear. Damos uma volta em que ele está sempre ao meu lado. Já sem trela, pois já é mais calmo”, descreve o tutor à PiT.
Já em casa, não perdeu o carinho de que lhe é característico desde o primeiro momento em que abriu os olhos. Aliás, até o superou: “Hoje em dia quer mais atenção. Dorme no pátio, na caminha dele com os gatos, pois é muito sociável, mas adora estar cá dentro. Sempre que acendemos a lareira, manifesta logo a vontade de entrar”.
O cão gosta de ser o centro das atenções. Segundo o seu dono-irmão, basta estar 20 segundos a olhar para a televisão, que Bobi mostra logo estar incomodado com a falta dela. No entanto, quando bateu dois recordes, perdoou os olhos postos no pequeno ecrã. Os do tutor e os de todo o mundo.
Não há qualquer segredo além do amor
Bobi adora peixe grelhado: “Consegue engolir uma dourada em 20 ou 30 segundos. Com um bocadinho de broa e azeite”, descreve Leonel à PiT. Já de esparguete à bolonhesa não é grande fã, mas não é esquisito com as sobras que os donos lhe dão.
Leonel não sabe qual é o segredo para Bobi ter vivido três décadas. Já se despediu de cães que foram tratados de forma semelhante, mas este parece ter algo de especial. No entanto, há vários fatores que o leiriense considera essenciais para dar uma boa qualidade de vida aos animais.
“A alimentação é fundamental. Já nos criticaram por não lhes dar ração, mas a verdade é que todos os meus cães foram habituados a isso”. Apesar disso, o tutor não é contra este tipo de comida, tanto que guarda para os companheiros de quatro patas dos seus quatro gatos, “cada vez que eles fazem uma visita ao seu pátio”.
Bobi também esteve sempre habituado à liberdade e nunca foi acorrentado a nada. “Somos uma família pobre e humilde. Nunca prendemos nenhum animal a uma casota. Temos um espaço no jardim e os nossos cães sempre passearam por lá”.
A cereja no topo do bolo, no entanto, é o amor que o cão foi recebendo ao longo dos últimos 30 anos. Não só dos donos, como dos habitantes de Conqueiros. Os responsáveis por motivar Leonel a inscrevê-lo no Guinness.
“Espera lá, se te safaste desta…”
Em 2018, Leonel quase se despediu de Bobi. “Ele teve uma espécie de AVC de humanos e ficou com imensas sequelas. Os médicos disseram que não ia recuperar, porque já tinha 25 anos”. O cão não só provou que estavam enganados, como lhes esfregou com dois diplomas recordistas.
“Há algum tempo que me diziam para concorrer ao cão mais velho português. Depois disso lhe ter acontecido, pensei: ‘Espera lá, se te safaste desta…'”. Era esse o empurrão que Leonel precisava para contactar o Guinness World Records. Mas não para bater o recorde de Portugal, mas sim o do mundo.

Desde 1939 que o título pertencia a Blue, o cão que tinha vivido 29 anos e cinco meses. “Quando percebi que o Bobi tinha passado esse limite, informei-me sobre como o inscrever no livro de recordes”. Leonel reuniu toda a documentação, levou o cão a exames médicos e enviou as fotografias possíveis de quando o cão era jovem para a organização.
No dia 30 de janeiro foi informado de que Bobi tinha, efetivamente, sido considerado o cão mais velho do mundo e de sempre. Guardou o entusiasmo e só partilhou a novidade quando recebeu os diplomas a comprovarem-no, no dia 2 de fevereiro.
O fim de uma era. Ou talvez não…
O dono de Bobi não quer que a sua linhagem fique por aqui. “Os outros cães foram partindo e ele ficou. É uma falha minha nunca lhe ter dado a oportunidade de ter filhos. O Bobi representa muito a nossa descendência”, confessa à PiT.
Leonel ainda guarda uma esperança de que Bobi consiga procriar, e pretende ajudá-lo com isso: “Já ando a falar com alguns veterinários para ver se é possível. Não é fácil, devido à idade, mas estamos à procura de uma cadela que ainda não tenha sido esterilizada”.
“Se não for dessa forma, terei de ver os custos de inseminação artificial”. Não é apenas o amor pelos animais que motiva o dono do cão, pois pretende adotar mais quando este partir: “Acho que, para o Bobi ter durado tantos anos, é porque tem algo de especial dentro dele”.
No fundo, Leonel só quer mais um companheiro de uma vida. E, se, por acaso, este quebrar mais alguns recordes, ainda melhor.
Carregue na galeria para ver algumas fotografias de Bobi, o cão mais velho do mundo de sempre.