Família

Furinho salvou Patricia da depressão — e tornou-se na musa das suas ilustrações

Começou como um rabisco e agora não consegue parar de desenhar o gato que trouxe uma alegria extra à sua vida.
O marido de Patricia era alérgico a gatos.

Já se passaram mais de três anos e, mesmo assim, a palavra “pandemia” continua a ser capaz de assombrar as pessoas. Não foi uma época fácil, e ainda há quem esteja a tentar ultrapassar os traumas que ela causou. Patricia Sodré é a prova disso, que só agora conseguiu voltar a pegar no lápis. E foi graças a uma grande ajuda de quatro patas.

A brasileira, 43 anos, sempre se dividiu por duas paixões: o surf e a ilustração. Anda nas ondas desde que se lembra, mas só há 30 anos é que as começou a desenhar no papel. No Rio de Janeiro, cidade onde nasceu e viveu, trabalhava como freelancer para diversas marcas. Mas a falta de segurança levou-a a mudar-se para este lado do oceano.

Com raízes francesas, a liberdade europeia sempre lhe correu nas veias. E casar-se com o neto de um português só ajudou à festa. Em 2015, Patricia e João decidiram mudar-se com a filha Maria para Portugal. Foi aí que a depressão começou a ser semeada na cabeça da ilustradora.

“A minha filha era recém nascida e mudámo-nos para cá sem olhar para trás. Encerrámos tudo o que tínhamos e deixámos o meu pai lá”, lamenta à PiT. O pai de Patricia continua a chamar “casa” ao Brasil, por isso recusou-se a mudar de país. Mas essa decisão não a deixou conformada: “Senti mesmo muita falta dele”.

O surf, que é o seu combustível, e os trabalhos de ilustração que fez por todo o mundo, tendo espalhado a sua marca pelos Estados Unidos da América e pelo Catar, ajudaram a aliviar o choque cultural. No entanto, cinco anos depois, chegou algo que veio germinar as pequenas sementes instaladas na cabeça de Patricia: a pandemia.

Patricia, que sempre desenhou plantas, viu-se presa como uma, num vaso. “Faltava-me energia para tudo. Entrei num processo muito profundo de depressão. À minha volta, as pessoas não percebiam o que se estava a passar. Já não queria a vida social e fugia de tudo”, descreve.

A ilustradora começou a ter diversos ataques de pânico, que a levaram até aos pesadelos diários: “Durante cinco meses, tive o mesmo pesadelo todas as noites. Sonhava que morria, e acordava assustada. Não queria morrer”, confessa.

Um pequeno passo para Patricia, uma grande patada para a sua saúde mental

Demorou muito tempo até que Patricia decidisse pedir ajuda, que foi “o passo mais difícil”. E, na mesma semana em que começou a terapia, surgiu algo que também prometia ser eficaz. “O meu marido apareceu, colocou-o no meu colo, e disse: ‘Este é o Furinho'”.

Foi assim que João apresentou o gato preto, com um pequeno buraco no topo da cabeça, a Patricia. A ilustradora nem queria acreditar: “Como assim um gato? Eu amo gatos, e sempre cresci rodeada deles. O meu pai tem nove felinos atualmente. Mas eu nunca pude ter um”.

Durante a relação de ambos, que dura há mais de uma década, houve sempre um pequeno senão, no que dizia respeito à adoção de gatos: João é extremamente alérgico. “Quando ele me colocou o gato no colo, nem consegui raciocinar. Só depois é que lhe perguntei: ‘O que vamos fazer? Tu és alérgico'”, conta.

“Depois resolvemos isso”, respondeu o marido. Patricia não teve outro remédio senão acatar as suas palavras. E olhar para aquele focinho, que tanto tinha sido renegado, também não a ajudou a mudar de ideias.

Furinho voltou a trazer felicidade à vida de Patricia.

Furinho tinha razão de se chamar assim. Da ninhada que foi abandonada, dentro de uma caixa, à porta de um casal, foi o gato com um buraco na cabeça o único a não ser escolhido. Mas não era justo que a mordida que sofreu de outro animal fosse a razão para não ter uma família.

Com a chegada do felino, surgiu outro stress: “E agora? Vou afeiçoar-me a ele, o meu marido vai ficar cheio de alergia, e vou ter de o mandar embora”. Furinho, contudo, mostrou que não havia razões para preocupações. Passaram-se seis meses, e João não espirrou uma única vez.

“O meu marido era alérgico a tudo. Agora, chega a casa, pega no gato, deita-o no colo e dorme com ele a tarde inteira”. Patricia viu nisto um sinal. E talvez tenha sido o mesmo a fazê-la pegar no lápis, para voltar a desenhar. Mas, desta vez, não era apenas plantas que queria ver no papel. Tinha uma musa diferente.

Furinho à janela, Furinho a cuspir um arco-íris, Furinho num sofá, numa floresta, num vaso… Quem vai a casa de Patricia, vê Furinho espalhado por toda a parte: “Comecei por fazer um rabisco dele e mandei ao meu marido: ‘Meu Deus, esse é o Furinho’. E é verdade, porque ele não é um gato qualquer. Comecei a pintar, uma atrás da outra, e não consigo parar de o desenhar”, ri-se.

Além do trabalho enquanto freelancer, Patricia também vende as suas obras online. Se também quiser ter Furinho em sua casa, basta aceder aqui. Os quadros estão à venda com preços entre os 29€ e os 36€.

O gato carinhoso, apesar de muito “bagunceiro”, salvou Patricia da depressão. E até fez com que a filha, agora com oito anos, olhasse para ela de forma diferente: “‘Mãe, estás bem? Estás tão alegre’, pergunta-me. ‘Filha, isto sou eu normal'”.

Carregue na galeria para ver algumas fotografias de Patricia e Furinho.

 

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