Família

Inês Sousa Real: “PAN quer que luto animal permita justificar uma falta ao trabalho”

Em entrevista à PiT, a porta-voz do PAN fala das conquistas do partido no orçamento e como começou a sua paixão por animais.
Leia a entrevista.

Teve o seu primeiro cão quando ainda estava na barriga da mãe. Aos três anos aprendeu logo a lidar com o desgosto da perda de um animal. Hoje em dia, é uma voz ativista da proteção animal, trabalhando todos os dias para legislar os seus direitos e criar políticas que ajam em conformidade. Inês Sousa Real, 42 anos, é jurista, mas o seu cargo enquanto porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), com assento parlamentar, é o mais conhecido.

Pegou o partido após a saída do seu antigo líder, o ex-deputado André Silva, e já passou por uma pandemia, uma dissolução de Governo, e nas últimas eleições legislativas perdeu 84 mil votos e viu reduzir-se a força do PAN de quatro para apenas um deputado.

Ainda assim, Inês Sousa Real não facilita na defesa da causa animal, tendo visto mais de 25 das suas propostas serem aprovadas na especialidade no Orçamento de Estado para 2023 (OE2023), aprovado na passada sexta-feira, dia 25 de novembro, com a abstenção do PAN..

Em casa, a única aprovação de que precisa é do gato Mikas, que, com 12 anos, “tem síndrome de filho único”, mas talvez porque a deputada o mime demasiado. A líder política está a ponderar, no entanto, adotar mais um animal, depois da partida da cadela Luna, logo após a campanha para as eleições legislativas. Mas terá de ser uma decisão sensata, pois a “adoção de um animal é para a vida toda”.

 

O OE2023 foi aprovado na especialidade pela maioria absoluta do Partido Socialista. Apesar de o PAN se ter abstido da votação final, quais foram as maiores vitórias do partido nestas negociações?

Foi muito importante termos conseguido uma linha de continuidade no investimento feito nos centros de recolha oficial. Estamos a falar de uma verba que, em 2022, foi de 12 milhões de euros. Com mais estes 13,2 milhões de euros, falamos de, em dois anos, 25 milhões de euros para a proteção animal. O que, tendo em conta o relatório da Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), que sinalizava que eram necessários 32 milhões de euros para os centros de recolha oficial, é um avanço significativo. Ainda que este relatório só tivesse em consideração os municípios que responderam e não os 308 totais. Ainda assim, estamos a falar de uma quantia muito significativa, que pode ter um impacto direto para a esterilização, com os três milhões de euros previstos, a rede de serviços veterinários públicos para a população mais carenciada e também a campanha de identificação de animais de companhia, que passou a ser obrigatória para todos os animais registados no Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC).

Apesar de o partido ter visto aprovar mais de 25 das suas propostas para o OE2023, houve algumas que ficaram de fora. Quais seriam, em sua opinião, cruciais constar do documento?

O reconhecimento ao luto pela morte de animais de companhia, por exemplo. O PAN quer que o luto animal permita justificar uma falta ao trabalho. Esta matéria era essencial ser aprovada, mas a maioria não quis. Há detentores que se veem na circunstância de ter que faltar ao trabalho de forma injustificada, por ter uma situação de emergência comprovada. Seja porque o animal tinha que fazer um exame urgente, porque sofreu um acidente ou até mesmo por estar em estado terminal. Quem tem animais de companhia sabe que, infelizmente, a vida deles é muito curta, face à esperança média de vida das pessoas. Portanto, quando se passa por esses desgostos, tem que, muitas vezes, estar a justificar a ausência laboral com um dia de férias ou doutro modo. O que o PAN estava a propor era uma dia de luto para este mesmo efeito.

Por que não foi aprovada essa medida?

O feedback que fomos tendo, até do diálogo com outras forças políticas, é que seria difícil limitar, caso as pessoas tivessem vários animais, ou até mesmo em função das espécies. Mas a verdade é que a proposta do PAN prevê, de forma muito clara, que isto só abrangia os animais de companhia inscritos no SIAC, ou seja, cujo registo é obrigatório, precisamente para gerar esta segurança jurídica. Registados em nome do trabalhador, precisamente para não criar circunstâncias que pudessem levar a abusos. A própria lei já permite mecanismos de fiscalização para quem tem um número de animais superior ao que é permitido, por exemplo. Portanto, tendo em conta que, num apartamento, só se pode ter no máximo quatro animais de companhia, estaríamos a falar de uma circunstância bastante infeliz de que alguém se visse na contingência de ter tido quatro animais a morrer no mesmo ano. Não podemos pensar no lado das fraudes ou abusos que possam existir, mas sim numa matéria que é da maior justiça.

Acha que não houve vontade política?

Não houve, de facto, vontade política para fazer aprovar esta matéria, mas vamos ter oportunidade de apresentar esta iniciativa em sede do processo legislativo, ou seja, fora do OE, e esperamos que aí seja possível um debate mais prolongado e a alteração do código do trabalho para que as pessoas possam ter acesso a este direito.

O Partido Socialista esteve recetivo a aprovar propostas do PAN?

Estamos num contexto diferente daquele que estávamos na legislatura passada. Com uma maioria absoluta, a abertura e a capacidade negocial de qualquer força política da oposição está mais reduzida. No entanto, o PAN não se demitiu de fazer essas pontes, para que conseguíssemos avançar com propostas no OE. Isso é muito importante. Ficaram pelo caminho medidas como a redução do IVA para os serviços médico-veterinários, de 23% para 6%. Mas, naquilo que foram as conquistas do PAN e no diálogo que foi possível fazer, a verdade é que conseguiu-se fazer a diferença em várias áreas. 

A redução drástica do número de votos nas últimas legislativas, e com a maioria absoluta do PS, não teme a perda de relevância do PAN? Não podemos estar aqui perante um fenómeno tipo PRD que ‘desapareceu’ a seguir à primeira maioria absoluta de Cavaco Silva, em 1987?

Isso é um desafio que nos traz a democracia. Nós temos que garantir que as nossas mensagens são conhecidas do público. Cabe-nos a nós, enquanto oposição, fazer avançar as nossas causas, mas também fazer as críticas que têm de ser feitas ao Governo. E o PAN não se coíbe disso. Isso nota-se quer pelos requerimentos de audição que temos feito para diferentes ministros, quer pela crítica que temos feito em relação à continuidade dos combustíveis fósseis ou as isenções fiscais que continuam ponderadas às grandes petrolíferas. Ou quando abrimos o debate aos lucros excessivos. O PAN foi a primeira força política a trazer essa matéria e a apresentar uma iniciativa legislativa sobre esse assunto. Ou seja, o nosso trabalho tem falado por si. Portanto, sabemos também o contexto excecional que vivemos nestes últimas eleições, em que tivemos uma pandemia, agora uma guerra, que veio trazer mais instabilidade à população e outro tipo de preocupações que não vivíamos há muito tempo na Europa. É evidente que isso reforça a exigência do papel canalizador das forças da oposição, mas acima de tudo o de trazermos propostas e soluções para as reais preocupações das pessoas. Temos quatro anos de mandato. Acreditamos que vamos fazer a diferença ao longo destes anos, e que vamos sair não só reconhecidos como reforçados. Inclusivamente, as recentes sondagens dão conta disso mesmo.

Mikas já tem 12 anos.

“Há um grande estigma de adotar animais idosos”

Falemos um pouco de si: os animais são uma paixão antiga?

Quando nasci, já tinha animais de companhia. Neste caso, era o Rá, um Pastor Alemão. Era da minha mãe e chegou lá a casa quando o meu avô, que nunca conheci, morreu. Por isso, era uma grande companheiro da minha mãe. Eu conheci-o já estava na barriga da minha mãe. Lembro-me de ter cerca de três anos quando o Rá morreu. Ele já tinha bastante idade, cerca de 18 anos, e, de facto, foi talvez o meu primeiro desgosto, era eu muito pequenina. Na altura, os meus pais foram buscar outro cão lá para casa. Durante toda a minha vivência, os animais fizeram parte da minha família. Além dos cães, dos gatos, tive também a Pombinha, que era uma galinha de estimação. Foi-nos oferecida em pintainho e acabou por viver no quintal da minha avó vários anos. Morreu com quase 12 anos, se não estou em erro. A minha avó tinha uma grande sensibilidade para com o próximo, fosse ele pessoa ou animal. Não havia animal que não encontrássemos abandonado que não levássemos e que a minha avó, ou arranjava uma família que ficasse com ele, ou então adotava-o. Tive a sorte e felicidade de nascer numa família que me transmitiu estes valores pelo respeito pela vida animal. Portanto, não imagino chegar a casa e não ter um animal de companhia. Seria um vazio muito grande.

Agora é o gato Mikas que completa esse vazio.

Sim. Neste momento, só tenho o Mikas, que tem 12 anos. É um gato que foi adotado quando era bebé. Já ponderei muito em ir adotar outro, porque, a seguir à campanha, perdemos a nossa cadela Luna.

Como foi lidar com a partida de Luna?

Foi uma fase difícil. Ela adoeceu, com um tumor cerebral. Já foi adotada idosa. Importa dizer isto, porque há um grande estigma em adotar animais idosos. Nós encontrámos a Luna abandonada na rua. Ela tinha cerca de dez ou 11 anos, de acordo com o que a veterinária estimava. Portanto, não sabíamos bem quanto tempo iria ficar connosco, até porque vinha em muito mau estado. Tinha sido claramente vítima de maus tratos e estava praticamente surda já. Portanto, não sabíamos bem quanto tempo ia durar. Mas a verdade é que esteve connosco durante cinco anos. Infelizmente, teve um tumor cerebral. Foi muito difícil, porque tivemos que tomar uma decisão que eu nunca tinha tido que tomar antes: adormecê-la. E isso coincidiu com o período da campanha. É sempre uma perda muito grande. Apesar de não a ter visto crescer, a partir do momento em que entram lá em casa, eu costumo dizer que dificilmente saem. Aliás, eu acho que não servia para família de acolhimento temporário. Louvo muito quem dá essa oportunidade aos animais, pois é difícil não nos apegarmos e não querermos ficar com eles. Esse até foi o caso da Luna. Na altura em que eu a adotei tinha mais outro cão e outra gata, e por isso eram quatro, e era suposto sermos família de acolhimento temporário. E acabámos por ficar com ela. 

Quando dá o próximo passo de adotar mais um animal?

Eu adorava adotar mais animais. Mas o Mikas tem 12 anos e já tem alguns problemas de saúde, já por força da idade. Tem displasia da anca. E tem um bocadinho síndrome de filho único [risos]. Se bem que há quem diga que sou eu que o mimo demais. Mas, de facto, a introdução de um animal vai ter que ser ponderada, também porque tenho menos tempo e disponibilidade, e a adoção é um compromisso para a vida. Temos consciência de que quando levamos um animal para casa temos que ter condições para lhe dedicar tempo. Portanto, quando o fizermos, será de forma muito ponderada e sensata. Porque de facto temos outro animal que tem umas características de saúde que dificultam essa introdução. Mas também sei que, tal como a Luna se meteu no nosso caminho e tantos outros animais, que, no dia em que se calhar me cruzar com outro, facilmente a família volta a aumentar.

Está à espera que um animal a necessitar de ajuda passe pelo seu caminho?

Eu sou ativista da causa animal. Portanto, antes de ser política e de entrar nesta vida, já estava na causa animal. Uma das coisa que faço questão, quer enquanto deputada, quer enquanto porta-voz do PAN, é de ter contacto com a realidade. Por isso, nós visitamos associações, canis municipais… Frequentemente cruzo-me, infelizmente, com milhares de animais que estão a precisar de ajuda. Neste contexto em particular, o meu coração vai resistir. Também não faz assim tanto tempo desde que perdemos a Luna, e acho que é importante dar espaço, pois foi uma perda muito forte e muito triste. E pelo Mikas que tem as suas necessidades e já vive lá.

Inês Sousa Real é ativista da causa animal.

“Há mais de 44 mil animais abandonados em Portugal”

Além da adoção de animais, como ajuda a causa animal de outras formas?

Vou ajudando as associações também dentro daquilo que são as nossas capacidades de ajuda. Há todo um caminho que pode ser feito. Mesmo quando não podemos introduzir nas nossas casas mais um animal, é importante que as pessoas saibam que podemos sempre ajudar de outras formas. Seja através do trabalho voluntário em associações, seja a contribuir com ração ou até mesmo do ponto de vista financeiro. Infelizmente, os dados oficiais dizem-nos que há 44 mil animais abandonados em Portugal. Não nos podemos esquecer disto. Isto são os números oficiais, dos canis municipais, nem sequer são de todos os do País e nem sequer engloba as associações. É absolutamente imprescindível que todos nós façamos a nossa parte, seja ajudando, divulgando para adoção, seja de facto evitando que nasçam mais animais de forma indesejada.

Que medidas podem ser tomadas para diminuir esse número de abandonos?

Há um caminho que tem que ser feito em parceria com as autarquias locais e as associações, que passa essencialmente por duas questões muito importantes. Aliás, diria três. O princípio basilar tem que ser uma questão de políticas de proximidade. Canis intermunicipais, que não passam por meros depósitos de animais, ou que remetem para as associações as suas responsabilidades, ou até mesmo autarquias que não têm espaços municipais ou que não promovem as campanhas de esterilização. É de facto uma demissão total daquilo que são as suas responsabilidades.

Mas não basta cuidar e proteger os que já estão na rua, é preciso evitar o seu crescimento…

Exatamente, a esterilização é absolutamente imprescindível. Esterilizar tem de ser a palavra de ordem. E nós temos, este ano, três milhões de euros previstos no OE para esse mesmo efeito. No ano passado, era de um milhão de euros. Por isso, já é um salto quantitativo bastante significativo. É muito importante que as autarquias promovam as campanhas e não apenas para os animais de famílias carenciadas. Há muito a ideia de que deve ser só para esses animais, mas recordo que todo o animal que entra abandonado no canil municipal tem de ser esterilizado, já decorre da lei essa obrigatoriedade. Verificamos muitas das vezes um incumprimento desta obrigatoriedade. E assim também vamos estar a evitar a produção não planificada ou aquela ideia pré-concebida de que é importante ter pelo menos uma ninhada ou que gostariam tanto de ter um cãozinho. Nós sabemos que infelizmente não há lares para todos os animais de companhia. 

E além da esterilização?

A identificação eletrónica. Verificamos um grande incumprimento nesta norma. Muitas vezes por razões de ordem financeira. Ele tem uma função muito importante. Um animal que está identificado eletronicamente permite-nos, por um lado, se estiver perdido, identificar o seu detentor e devolvê-lo  Se o animal não estiver identificado, a grande probabilidade é que acabe abandonado. Por outro lado, a identificação permite não só identificar quem abandona animais, como também os descontos das despesas animais no IRS. Havendo esta associação do chip ao número fiscal de contribuinte, já permite uma série de questões do alívio financeiro das famílias. E não deixa de ser relevante para diminuir este flagelo do abandono. Agora, isto não se faz com políticas que não sejam de proximidade e com meros depósitos de animais. Não pode ser esse o compromisso de uma sociedade que quer estar de mãos dadas com a proteção animal. Até por causa da formação dos agentes e magistrados que atuam neste domínio, que conseguimos aprovar neste orçamento.

 

“Na Assembleia há coexistência pacífica entre deputados e animais”

Enquanto o partido luta por estas causas e faz aprovar medidas em prol da proteção animal, há um gato no parlamento para vos dar apoio, o Tobias. Ele recebe mimos de todos os deputados ou só do PAN?

Não somos os únicos a dar-lhe carinho. Se calhar somos aqueles mais assíduos, a picar o ponto nas festas do Tobias [risos]. Mas temos de facto aqui uma colónia bastante alargada: a irmã do Tobias, o Júnior, um gatarrão preto que apareceu aqui, que já está esterilizado e que está a tentar ganhar o seu território. O Tobias e o Júnior são aqueles que têm mais lata para entrar mesmo dentro da Assembleia. Sobretudo quando está frio, em que eles gostam de vir para dentro do corredor, e à hora da refeição, sentam-se religiosamente no meio, entre o jardim e o refeitório, porque sabem que é o local de passagem. tanto dos deputados, como das funcionárias. Em particular a enfermeira Lina, que é quem maioritariamente alimenta a colónia e que trata de qualquer outra questão.Conseguimos também a colocação de um abrigo nos jardins da Assembleia para colocar a alimentação da nossa colónia. Depois temos também os pavões, que são vários e também vêm na hora da refeição. E também temos duas gaivotas [risos]. Portanto, é uma família de muitas espécies aqui na assembleia.

No entanto, o Tobias é o mais mediático e quem também chama mais à atenção dos deputados.

Sim. O Tobias é um ícone aqui na assembleia. Todos simpatizam com ele. Ele já está a ficar também velhote. Se não estou em erro, tem a mesma idade que o Mikas. E ele é mesmo muito simpático. Acho que é oficialmente o nosso gato parlamentar, que faz as boas-vindas e as delícias a quem nos visita. E acho que também se tornou num embaixador dos animais de rua e das colónias, porque tantas vezes verificamos que muitas vezes não são aceites em algumas comunidades. Ou porque há conflitos, ou não estão esterilizados ou porque se passeiam entre os quintais. Acho que uma colónia que está registada, esterilizada e que se passeia entre a residência oficial do primeiro ministro e o parlamento é de facto um exemplo de boas práticas que aqui temos e que demonstra que é possível esta coexistência pacífica entre deputados, funcionários e os animais.

O Tobias já chegou a participar nas discussões no plenário ou fica só pelos corredores?

Ele está pelos corredores, mas há muitas histórias de que o Tobias já foi para várias cadeiras aqui da assembleia. Até que a mãe do Tobias passeava pelos sítios mais inusitados da assembleia. A primeira vez que o vi a passear perto das salas das comissões, pensei que estivesse perdido. Mas não, ele tem um grande à vontade e conhece todos os recantos. Às vezes, quando está mau tempo, as pavoas também trazem os seus bebés cá para dentro. Portanto, é muito giro ver isso. Acho que é de facto uma sinergia que se criou aqui, que demonstra como é possível coexistir e respeitar os animais.

Tobias, o gato parlamentar.

Apesar de o PAN não ser o único a dar mimos ao embaixador felino do parlamento, já viu outros deputados a fazê-lo? André Ventura, Catarina Martins…

No caso da Catarina, sei que sim, que já publicou nas suas redes, mas eu nunca vi. Assim como o André Ventura. Aquilo que maioritariamente vemos são os funcionários que têm um grande carinho pelos gatos. Mas o que noto é que de facto é uma preocupação transversal a todas as forças políticas. Nunca vi ninguém a levantar questão em relação à presença dos animais aqui no parlamento. O que temos visto, em regra, é esse respeito e esse carinho que nutrem pelos gatos. Acho também que, de vez em quando, sobretudo em época orçamental, ele vem aqui lembrar-nos e exigir mais proteção para os animais, porque há sempre um timing certo quando ele aparece, depois de longas horas de negociação. E lá damos contas ao Tobias do que andamos a fazer.

 

IRA? “Há um fascínio pelos bad boys”

Como é que a Inês olha para o papel do IRA no terreno? Há quem diga que o IRA é uma espécie do braço armado do PAN. Pelo menos de mãos dadas andam…

Bom, não acho que seja andar de mãos dadas. O PAN tem um respeito por todas as associações que trabalham em prol dos animais. Nós temos uma missão comum: a proteção animal. Mas temos papéis distintos. O PAN é uma força política, um partido. A sua missão é legislar. Nós trabalhamos e colaboramos com todas as associações que possam de alguma forma pedir ou não apoio. Agora, somos de facto realidades juridicamente diferentes e ao nível de entidade também. O PAN tem, e sempre terá, a boa prática de respeitar as associações, o seu papel. De reconhecer a missão importante que representam na nossa sociedade, independentemente de ser o IRA ou qualquer outra associação.

Mas o IRA tem um grande impacto mediático…

Sim, é verdade. Mas, apesar do mediatismo que o IRA tem ganhado ao longo dos últimos anos, a verdade é que temos outras associações, como a Sociedade Protetora dos Animais, que lutaram pela abolição da tauromaquia, tiro ao pombo, etc. Portanto, aquilo que nos cabe enquanto força política é olhar para estas várias associações, incluindo o IRA, e respeitar o seu papel e o seu trabalho no dia-a-dia. A verdade é que nós estamos aqui a legislar e a trabalhar em prol de políticas para a proteção animal, mas, apesar de termos muitos ativistas do PAN, são as associações e os cuidadores informais de animais que se levantam todos os dias para os ir alimentar, limpar e entre muitas outras questões. E muitas vezes lidam com um espectro de maldade e violência. Portanto, a todos eles devemos o nosso reconhecimento, sem distinção. Eu percebo que haja um fascínio pelos bad boys, por isso não me espanta que às vezes o IRA se torne um pouco mais atraente à polémica [risos]. Mas devemos olhar com seriedade o papel de cada associação e saber respeitá-lo.

Qual é a sua opinião em relação às acusações de terrorismo que são feitas ao IRA?

Não conheço aquilo que é a atuação e o modus operandi do IRA para retirar conclusões. As associações, tal como qualquer outra entidade, pública ou privada, têm que prestar contas em termos societários e têm que atuar com plena transparência. Sejam elas da causa animal, social, humanitária, entre outras. Portanto, é evidente que, se uma associação se desviar dos fins e da atuação do ponto de vista do estado do direito democrático, nós não nos revemos nisso.

O PAN revê-se na atuação do IRA?

O PAN revê-se na atuação de todas as associações que apoiam a causa animal. Se alguma vez se viesse a confirmar que aquilo que existia em torno do IRA era verdade, obviamente que o PAN distanciar-se-á. Agora, não existindo nem provas ou outro tipo de evidências disso, cabe-nos apenas respeitar e agradecer o trabalho que as associações fazem. O PAN não tem o dever de fiscalizar, há entidades para isso. O nosso trabalho é um trabalho político. Não obstante de, um dia quando despirmos estas vestes políticas, estaremos sempre no ativismo e ao lado das causas que nos trouxeram até aqui.

 

“Não faz qualquer sentido que no século XXI se continue a maltratar animais como forma de espetáculo”

Alguma vez assistiu a algum espetáculo de tauromaquia?

Não. Eu sempre fui contra. Nunca me foi incutido, pelos meus pais e avós, o gosto por esse tipo de espetáculos. Muito pelo contrário. Sempre quiseram que não fosse a touradas. Por isso, desde pequena que estou sensibilizada, sempre lutei e fiz parte para o fim da tauromaquia. Aliás, cheguei a constituir “O Meu Movimento”, em que se podia agendar audições com o primeiro ministro, e sempre defendi isso. Desta forma, desde cedo tive esta visão e preocupação, que levarei até ao fim.

E, enquanto porta-voz do PAN, continua a expor essa visão e preocupação…

Não nos faz qualquer sentido que, em pleno século XXI, se continue a maltratar animais como forma de espetáculo. Aliás o projeto civilizacional permite respeito pelos outros, sejam humanos ou animais. E tal como já abolimos outro tipo de espetáculos com recurso ao uso de animais, é fundamental que o mesmo seja feito com a tauromaquia, que, todos os anos, causa maus tratos a animais, dentro e fora da arena.

A luta pelo fim da tauromaquia tem em vista apenas o sofrimento dos animais?

Não. Por outro lado, a tauromaquia tem beneficiado de uma série de isenções. São dados 16 milhões ao ano em subsídios e outros apoios. Recebem apoios financeiros através das autarquias e da venda de bilhetes. Só para não falar dos apoios da PAC para a criação de bois. Estando o País neste momento em crise financeira… Não podemos continuar a alimentar este espetáculo cruel, como medidas que pedem a redução do IVA de 23% para 6%, por exemplo.

De que forma é que será possível abolir a tauromaquia em Portugal?

Pretendemos que haja uma conversão dos espaços usados para esta finalidade para outras atividades. Como o bailado, cinema, teatro e música. No fundo, que sejam livres do sofrimento. Além disso, queremos também que haja uma conversão dos profissionais que atuam nesta área, para que sejam canalizados para outras.

Qual será o próximo passo?

Neste momento, temos uma iniciativa legislativa do cidadão em curso. Ao longo dos anos, temos apresentado inúmeras petições públicas, e o legislador tem-se colocado sempre ao lado destes lobbies. Não faz sentido que todas as sondagens e petições digam que os cidadãos estão contra este tipo de espetáculos e o legislador não ouça. 

Carregue na galeria para ver algumas fotografias de Inês Sousa Real com os seus animais.

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