Família

Novo Provedor de Lisboa: Os animais não são coisas, por isso não se devolvem

Quando um animal é entregue de volta, há um desalojamento, uma desistência. Pedro Paiva defende esta mudança de conceito.
Pedro Paiva diz que há que encontrar o match perfeito.

Pedro Emanuel Paiva — o recém nomeado Provedor do Animal da Câmara Municipal de Lisboa — defende que o termo “devolução” não é o correto quando falamos de animais adotados que são entregues de novo no canil (agora denominado Centro de Recolha Oficial de Animais – CROA) ou associação onde as famílias os foram buscar.

“É preciso mudar a terminologia. Os animais não são coisas, por isso não se devolvem”, sublinha Pedro Paiva à PiT.

A sua perspetiva, enquanto provedor, é que “o enquadramento da devolução está desajustado quando olhamos para os animais de companhia, tanto socialmente como no contexto jurídico e científico”.

“Quando falamos em devolver, é como se estivéssemos a falar de uma coisa, mas estamos a falar de um ser vivo senciente. Esse retorno ao local de origem vai ter impactos negativos no animal e o termo devolução é desajustado”, diz, defendendo que se mude esse paradigma com a adoção de um novo conceito.

Então que termo deve ser usado? Pedro Paiva aponta dois. “Deveríamos olhar para esta situação como um processo de desalojamento ou de desistência. Não é um objeto que se está a devolver”, sublinha.

Esclarecida a questão da terminologia, o que leva as pessoas a levarem de volta animais que adotaram, por vezes numa questão de dias, outras vezes após longos anos de convivência? Além da falta de preparação, e frequentemente também da notória falta de responsabilidade, pode haver também falhas por parte de quem dá os animais para adoção, pelo que é preciso começar a apertar as malhas da triagem.

Há que encontrar o match perfeito

Para Pedro Paiva, é essencial perceber o que desencadeia este processo de retorno de um animal. E, no seu entender, “alguns CROA e associações têm dificuldades em encontrar o match perfeito. Há que olhar o animal e as características da família candidata a adotante e casar todos os aspetos para se conseguir esse match perfeito”.

Por isso, o nomeado Provedor do Animal de Lisboa considera que os desalojamentos, ou desistências, podem ser combatidos de forma preventiva. Uma outra forma de o fazer, defende, é tentando perceber se se trata de uma decisão por impulso, isto é, se há falta de envolvimento no momento da adoção.

“Muitas famílias desconhecem as necessidades reais quando um animal vai para um alojamento. A questão financeira também tem de ser ponderada”, aponta Pedro Paiva.

Assim, para o especialista, há três vetores principais que desencadeiam o processo de desalojamento ou de desistência: falta de envolvimento da família por se tratar de uma decisão impulsiva; falta de conhecimento generalizado sobre as necessidades da espécie que vai ser integrada na família; e a questão financeira.

Tudo isto remete para o lado das famílias, dos CROA e das associações, refere Pedro Paiva. E é aqui que se tem de procurar o equilíbrio para chegar ao tal casamento sem divórcio. “Os CROA e as associações deviam tentar desenvolver mecanismos de continuidade para a adoção responsável”, defende.

O outro lado: depressão e trauma nos animais

Quando se dá uma desistência, chegamos a um outro lado do problema: o impacto extremamente negativo para o animal, que entretanto já estabeleceu vínculos afetivos.

Pedro Paiva salienta que “adotar um animal e depois desalojá-lo desencadeia traumas e depressão, levando a que muitos sofram depois de ansiedade de separação” — tendo medo de ficar sozinhos sem casa, por receio de nunca mais voltarem a ver, uma vez mais, a nova família.

“Por detrás disso vêm uma série de comportamentos indesejados: deixam de comer e alguns desenvolvem alguma reatividade devido à rutura imediata dos laços que desenvolveram com a família adotante e ao regresso a um abrigo — que não é propriamente um lar”, frisa.

“Quando um animal é adotado, vincula-se rapidamente e a rutura desse laço gera emoções de depressão e trauma”, acrescenta, sublinhando ainda que os CROA, legalmente, não têm obrigação de os receber de volta. No entanto, quando não estão lotados, é o que acabam por fazer — dado que, se não o realojarem, o mais provável é que ele vá parar à rua.

De qualquer das formas, legalmente, “os Centros de Recolha Oficial de Animais só têm de os recolher quando estão na via pública ou quando assim é determinado por uma entidade judiciária ou pela Direção Geral de Alimentação e Veterinária”, explica Pedro Paiva.

O novo provedor de Lisboa não tem mãos a medir no que diz respeito à defesa e promoção dos direitos dos animais. E a mudança de conceito quando se desiste de um animal é para Pedro Paiva de extrema importância. “Olhar como uma devolução fica mais fácil para a pessoa que o entrega de volta. A pessoa tem de perceber que está a desistir de um ser que tem emoções”, salienta.

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