Salvador foi encontrado quase morto. Cego, com um buraco no nariz e num estado de magreza extrema. O cão sofreu e traz um grande e inexplicável trauma às costas. Contudo, arranjou alguém que reparasse as cicatrizes físicas que tem no corpo. As psicológicas já serão mais difíceis.
Foi Vera Vaz quem o encontrou. A mulher de 49 anos não se dedica ativamente à causa animal, mas tem “um íman”, que a puxa para quem mais precisa. Salvador era um deles. “Encontrei-o na serra. Quando o vi, achava que estava morto e que já não havia nada a fazer”, começa por contar à PiT.
Felizmente, Salvador estava vivo. E continuava cheio de amor, apesar de todo o trauma vivido: “Ele é muito ternurento. Deixou-me logo pegar nele, para lhe dar miminho”. Antes de ligar à Polícia de Segurança Pública (PSP), Vera tentou dar-lhe comida, visto que traz sempre biscoitos consigo no carro, mas isso pareceu ser uma missão quase impossível: “Ele ficou meio aflito a tentar encontrar a comida, e aí percebi que estava cego. Ainda por cima, como não tinha olfato, foi ainda mais difícil”, descreve.
Quando a PSP chegou, chamou o Centro de Recolha Animal de Loures (CROAL) que levou o cão, com cerca de quatro anos, para o hospital. Salvador “tinha lesões graves no nariz, os olhos inchados e cego de um deles, desnutrido e sem força para se movimentar”, conforme descreveu à PiT.
Assim que o examinou, perceberam que tinha levado um tiro. Apressaram-se a saber quem tinha sido o autor deste ato hediondo e, através do microchip, conseguiram detetar o dono, que “disse que o cão já tinha desaparecido há muito tempo e que já não o queria”.

Salvador, nome fictício usado pelo CROAL, para proteger a sua identidade do tutor, foi encaminhado para o Hospital Veterinário da Lusófona, onde sofreu várias intervenções cirúrgicas: “Foi sujeito a uma enucleação de um olho, reconstrução do plano nasal, remoção de alguns chumbos e tratamento para a dirofilariose”, explicou o CROAL à PiT.
Vera encontrou-o, e nunca mais o conseguiu largar. Ia ao hospital quase todos os 27 dias em que esteve internado, e seguiu todo o processo de recuperação. E não foi a única a apaixonar-se por Salvador: “Toda a gente no hospital ficou doida por ele. Ele é um cão tão dócil e amoroso, que é impossível não ficar”.
Já que Vera não pôde ficar com ele, visto que tem outros animais, inclusivamente “um cão surdo, com 50 quilos, e elétrico”, foi outra das apaixonadas por Salvador a fazê-lo: “Pelo que sei, a nova família dele é uma menina que está a estudar na Universidade Lusófona. Ele conquistou-a”, explica.
Salvador voltou a ganhar alegria no pêlo: “Temos recebido diariamente informações, relatos fotográficos e vídeos do Salvador na sua nova família muito feliz e a recuperar na medida do possível. Está estável, brinca e passeia com o seu novo amigo de quatro patas. Adora receber miminhos e retribuir, alimenta-se bem, sente-se seguro e grato por ter sido salvo. É um valente o nosso Salvador”, remata o CROAL.
O cão pode finalmente colocar a dor no passado. Já sem os estilhaços da arma que lhe tiraram a visão, mas que não tiraram a vontade de amar e ser amado. E agora pode fazê-lo. Já Vera, os trabalhadores do CROAL e as pessoas que acompanharam o cão no hospital querem justiça, e avançaram com um processo judicial contra o dono, por “crime de abandono e maus-tratos”.
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