Storm foi amarrado ao portão da União Zoófila (UZ) há 11 anos. Há 4.017 dias que vive na associação lisboeta, onde é “obrigado” a olhar todos os dias para o local onde os seus antigos donos o abandonaram. Já passou por muito e quis sempre viver mais um dia. Movido única e exclusivamente pela esperança de um dia poder deixar aquele portão para trás.
Os voluntários da associação já estão mais do que habituados a acolher animais que são deixados à sua porta. E não o dizem com o mínimo de orgulho: “Já aconteceu deixarem-nos transportadoras com gatos e cães na entrada, em plena luz do dia. Com pessoas a entrar e a sair. Agora, já não acontece tanto. Deixam-nos amarrados a uma árvore que está mais distante”, revela à PiT Margarida Saldanha, 49 anos.
Na UZ todos são tratados por igual pelos voluntários. Quer tenham sido encontrados na rua ou acorrentados ao portão de boas-vindas, como foi o caso do cão mix de Staffordshire e Bull Terrier. No entanto, o mesmo não acontece com os seus seguidores.
Há cães que têm mais visibilidade do que outros, nas redes sociais. E, geralmente, quanto pior estiver o animal, mais atenção tem, como foi o caso de Sombra, que viveu 11 anos sob a negligência dos donos e terá um final feliz em breve. Já Storm, luta há 14 anos para continuar a viver, mas combateu todas as batalhas no silêncio.
“Ele é um cão muito dócil e é uma história de resiliência”, destaca Margarida. Quando o cão chegou à UZ, em 2012, já vinha com leishmaniose. Mas o verdadeiro terror aconteceu quatro anos mais tarde: “Tivemos um surto de esgana no canil e, apesar de ele estar vacinado, não lhe conseguiu escapar. Aí, entrou em quarentena absoluta”.
“O facto de ter ficado uma temporada sem sair gerou algum stress e uma maior reatividade a outros cães”, recorda a voluntária. Não foi fácil voltar a trazer felicidade e energia ao cão que outrora foi amarrado no portão. Mas, aos poucos, Storm foi permitindo que o sol apaziguasse todas as tempestades.
“Ele é um grande exemplo. Safou-se da esgana, controlou a leishmaniose e ainda cegou de um olho. Agora, já não só é solto no abrigo, como vai uma vez por dia à rua”. Storm tem uma madrinha “que lhe dedica tempo” e que vai frequentemente à associação. Mas isso continua a não ser suficiente para se sentir um cão completamente feliz.
Com 14 anos, Storm já é considerado um cão sénior, o que o torna menos atrativo a possíveis adotantes e também mais fraco para lutar contra outras tempestades. Contudo, não é por isso que deixa de tentar. E a última foi a prova disso.
Em maio, o cão foi-se abaixo, devido aos problemas em andar e às dores infernais que isso lhe causava. “Pensámos que pudesse estar com uma doença osteoarticular degenerativa. Foi internado no hospital, mas voltou de lá com as mesmas dificuldades motoras”.
Aí, a madrinha angariou fundos para pedir uma segunda opinião a outro hospital: “Fizeram uma TAC e visualizaram duas hérnias. Foi operado em junho e já está em fase de reabilitação. Já está a andar, o que é fantástico. Ninguém estava à espera”, diz Margarida.
Storm vai ficar mais um mês na clínica de reabilitação, o que significará um custo de 600€ para a UZ, fora as despesas de alimentação e medicação: “Diria que, com este miúdo, gastámos cerca de três a quatro mil euros, no espaço de um mês. A diferença foi tratar em vez de eutanasiar”.
A “velhice” de Storm em nada impediu que tivesse uma segunda oportunidade. Pelo menos, é assim que os voluntários veem a situação. Só é pena que não seja vista dessa forma por possíveis adotantes. Mas o cão não desiste de encontrar uma família que lhe dê um último conforto no final de vida.
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