Foi há mais de um mês, que Xerife apanhou o comboio para a maior aventura da sua vida. Numa noite de grande trovoada, o cão de sete anos fugiu com medo. Para a família, já era normal ele dar as suas voltinhas. Mas, desta vez, não voltou.
“De manhã, o Xerife vem sempre dar as boas-vindas à minha mãe. É uma Bolacha Maria para ele, um café e um cigarrinho para ela, e os dois conversam”, conta à PiT a filha, Isabel Duarte.
Celene Duarte e Xerife apaixonaram-se logo no primeiro momento em que se viram. A mãe de Isabel chorava a morte do seu cão, Patinhas, com 17 anos, e a filha decidiu animá-la. “Ela tinha ido dar um passeio pela ria de Aveiro. Fui visitar uma senhora que tinha uma ninhada de cães, e perguntei se podia ficar com um. Ela mostrou-me um, dois, mas eu gostei daquele que parecia um cavalinho”.
Foi a risca branca no focinho que conquistou Isabel. Já a Celene, foi o carinho que lhe deu, mal a viu: “Cheguei a casa, e disse: ‘Mãe, tenho uma coisa para ti’. Ela respondeu-me muito triste, mas sorriu logo quando viu o Xerife. Ele saltou para o colo dela e encheu-a de mimo”, conta entusiasmadamente.
Os dois não se largavam, e, por isso, Celene ficou muito em baixo quando Xerife desapareceu. Pôs toda a gente à sua procura: tias, netos e até a própria filha, que não gosta de caminhar. “Perguntei uma vizinha se o tinha visto, e ela vira-se para mim e diz: ‘Oh Isabel, o Xerife está em Lisboa'”.
Assim como muitas pessoas, a vizinha tinha visto a publicação de um jovem no Facebook, que mostrava um cão no Alfa Pendular, que parte de Aveiro com destino a Faro. Mal Isabel viu a fotografia, tentou de imediato contactar o homem, sem dizer nada à sua mãe, para não a alarmar.
“O rapaz viu-o no comboio, saiu em Lisboa, e entregou-o à polícia. Lá, amarraram-no a uma corda até terem mais informações, mas ele acabou por fugir”. Xerife não tinha chip, pelo que foi ainda mais difícil encontrá-lo.
Foi no Parques das Nações que encontrou o que podia ser a sua nova família: “Entrou num restaurante e deitou-se aos pés de uma jovem. Ela afeiçoou-se logo a ele. Publicou uma fotografia com ele, e, mal a vi, mandei-lhe logo uma mensagem”.
A jovem demorou mais de um dia a responder a Isabel, e foi em lágrimas que atendeu o telefone: “Eu encontrei o seu cão, mas já me afeiçoei tanto a ele. Já lhe comprei uma cama, brinquedos, e ele até já dorme comigo”. Apesar do desgosto, acabou por devolver Xerife à sua família, mas não teve coragem de se despedir dele.
Celene rumou para Lisboa para ir buscar o seu cão. Os dois reuniram-se para nunca mais se largarem. Isabel costuma brincar a dizer: “Para a próxima, vai para as Bahamas, para eu ter que te ir lá buscar”.
Já conhece a capital, mas prefere guardar a memória no recanto da sua casa
Xerife adorava ir à procura de “meninas”, principalmente quando estavam com o cio. Agora, prefere ficar por casa, onde as suas donas fazem dele o que querem: “Já lhe pintei as unhas, fiz madeixas, pus colares. Eu deixa fazer tudo”, ri-se Isabel à PiT.
O cão recusa-se mesmo a sair de casa sozinho: “Agora, já não passeia. Sempre que alguém sai, ele fica na varanda à espera que chegue a casa. Está traumatizado, e tem medo de sair à rua”, confessa.
Isabel garante que já está a ser muito mimado, para o tornar mais confiante: “Nos primeiros dias, andou muito apático. Mas agora já está muito bem, e anda sempre atrás da minha mãe”.
Xerife vê Celene como a sua guardiã, mas, na verdade, foi ele quem já lhe salvou a vida: “Uma vez, a minha mãe estava a tomar banho e , como tinha sido operada às costas, não conseguia pôr a cabeça para trás. O champô escorreu-lhe todo para a boca e ela começou a engasgar-se”, começa por contar.
“O Xerife saiu de casa, e foi a correr para a minha porta a ladrar. Eu pensei logo que algo de mau se passava com a minha mãe. Fui para casa dela e encontrei-a aflita. Ele é muito esperto”.
Esta não foi a primeira vez que Xerife chamou por Isabel num momento de agonia. Nos primeiros meses de vida, chegou mesmo a ligar para ela: “Quando lá chegou a casa, só gania à noite. Uma vez, recebi uma chamada à 1h da minha mãe, e só ouvia o Xerife a ladrar. Pensei que era a minha mãe a castigar-me por tê-lo levado lá para casa”, goza.
“No dia a seguir, liguei para perceber por que me tinha ligado àquela hora, e ela ficou confusa, porque não o tinha feito. Foi então que percebemos que o Xerife deve ter carregado nas teclas sem querer, e ligado para a última pessoa que tinha falado com ela. Neste caso, era eu”.
Para acabar com a gritaria, Celene decidiu colocá-lo lá fora. E resultou. Agora, Xerife só quer dormir lá fora: “Até nestas noites de grande temporal, ele pede para ir. Começa a queixar-se e ela tem que abrir a janela”.
Xerife não protege só humanos, como felinos também
Xerife e Pussy são os melhores amigos. A gatinha de seis meses lembra-se bem do dia em que foi salva pelo rafeiro que a encontrou no meio das silvas: “Ele arrastou-me de casa a ladrar, e eu segui-o para ver o que ele queria. Vi uma gata, e quando tentei pegar nela, ela fugiu”.
“Ele continuou a ladrar, e eu perguntei-lhe: ‘O que queres? Ela fugiu’. Foi então que olhei para baixo e vi uma gatinha pequenina, cheia de formigas”, descreve à PiT Isabel Duarte. Agarrou nela e levou-a ao veterinário. Descobriu que, apesar dos 400 gramas que pesava, a gata já tinha três meses: “Não sobrevivia nem mais um dia”.
Batizou-a de Pussy, em homenagem a uma gata que tinha tido, que acabou por ser assassinada. Quem também a acolheu foi Xerife, e os dois brincam até se fartarem: “Desarrumam tudo, saltam na cama… Ele mete a cabeça dela na boca, e ela sai de lá toda babada”, ri-se.
Quando Xerife estava a viver a sua aventura, Pussy foi quem sentiu mais a sua falta: “Ia lá para dentro, para a sala, para o quarto procurá-lo. Via-se mesmo que o queria para brincar”. Quem não quis saber do cão foi Becky, a “gata snob” lá de casa, que também não liga nenhuma à “pequenita”.
Carregue na galeria para ver algumas fotografias de Xerife, de regresso a casa.