Os vários estudos que têm sido feitos ao longo dos últimos anos não deixam margem para dúvida: a medicina veterinária está entre as profissões com maior número de casos de esgotamento, “burnout” e suicídio. Os motivos para o desgaste são muitos: a incapacidade de salvar um animal, as acusações injustas de que são alvo por parte de tutores desesperados, as muitas horas de trabalho aliadas a remunerações baixas e a própria eutanásia. Tudo isto deixa um profissional “de rastos”. Agora, numa entrevista à CNN Portugal, o Bastonário da Ordem dos Médicos Veterinários, José Cid, fala de duas tendências crescentes nesta área, especialmente junto dos mais jovens. Poderão as coisas mudar?
Segundo José Cid, há um “novo paradigma” na medicina veterinária: os profissionais que cada vez mais evitam eutanasiar um animal, mesmo quando os tutores o sugerem, e os estudantes desta área que alegam objeção de consciência para não fazerem inspeções a matadouros.
“Na prática em clínica de animais de companhia, começam a aparecer médicos veterinários que se recusam a fazer uma eutanásia”, diz José Cid. E nem mesmo o facto de a eutanásia apenas “ser usada em casos extremos” minimiza a situação, pois há cada vez mais veterinários a revelar “dificuldade” em aplicar “este ato médico”, sublinha. Para que seja aplicado é preciso “haver motivo” e é “sempre levado em conta o sofrimento do próprio animal”.
As mudanças não se notam apenas neste campo. De acordo com o bastonário, muitos estudantes universitários estão a começar a recusar ir aos matadouros. Assumem-se, para tal, como objetores de consciência – dia que é mundialmente assinalado a 15 de maio.
“Começa a haver agora alguns casos de objeções de consciência” no curso de medicina veterinária, “com alguns estudantes a colocarem objeções a ter certas práticas, nomeadamente a nível da inspeção sanitária nos matadouros” para não terem de assistir à morte dos animais, aponta José Cid à CNN Portugal.
Para o bastonário, isto pode vir a revelar-se um problema. “Faz parte da medicina veterinária a inspeção dos matadouros. Todos os alimentos que são consumidos pelos humanos e que são de origem animal têm de ser controlados, inspecionados e analisados por um médico veterinário”, salienta na mesma entrevista. “Se toda a gente começasse a ser assim, colocava-se em causa um dia os alimentos de origem animal”, considera.
Também nos tutores há mudanças visíveis, segundo José Cid. Os médicos veterinários, enfermeiros e auxiliares – especialmente os mais novos – evidenciam uma maior repulsa e negação na prática da eutanásia, mas os próprios donos mostram mais vontade de lutar até se esgotarem todas as possibilidades. “A maioria dos detentores de animais quer levar até ao extremo o tratamento do próprio animal”, refere.
“Antigamente eram poucos os detentores de animais de companhia que, por exemplo, autorizavam a fazer uma amputação de um membro. Ou, no caso de o animal estar completamente paralisado, que quisessem continuar a tê-lo com uma espécie de um carrinho próprio, adaptado”, diz, garantindo que hoje “é precisamente o contrário”.
Veterinários e tutores de mãos dadas
A evolução da própria medicina veterinária, com os avanços tecnológicos e científicos a permitirem encontrar mais e melhores soluções, tem ajudado neste caminho. A contribuir está também a maior consciência dos tutores para a necessidade de levarem os seus amigos de quatro patas ao médico para ver se está tudo bem e não apenas quando ficam doentes.
Percorra a galeria e veja algumas imagens das idas ao veterinário dos pets, que são cada vez mais vistos como um membro da família.